Sobre a capacidade da criança se preocupar com o outro

A partir de quando uma criança é capaz de se preocupar com o outro?

Hoje vamos abordar um pouco um assunto que li e vivenciei muitas coisas nos últimos 2 meses: a empatia.

São 10h00, estou com minha família e amigos em um praia relativamente tranquila do litoral paulista quando, de repente, começam a chegar mais e mais famílias munidas de suas cadeiras de praia, guarda-sóis e caixas de som. Apesar da distância de uns 20 metros entre uma família e outra, o funk (que poderia ser qualquer coisa: MPB, Sertanejo, Erudito, New Age, Axé, Pagode, Rock n' Roll) começa a rolar solto entre os frequentadores, onde o cruzamento de diversas músicas conduzem a batidas descompassadas e letras embaralhadas que confundem qualquer ouvinte desavisado cujo primeiro pensamento é que deveria ter providenciado a sua caixa para que a do outro não afetasse seus tímpanos e sua saúde mental.

O desespero daqueles que viajaram sem sua caixa de som, para curtir e relaxar na praia é nítido. Pelo que ouvi, isso não ocorre pq é carnaval. Janeiro foi assim, daqui pra frente será assim: ou você leva a sua caixa de som para abafar o som proveniente das famílias ao redor, ou toma uma boa dose de analgésico para as dores de cabeça. E conversar, conviver, relaxar na praia, nunca mais! Oi?

Recentemente, li alguns textos de mães indignadas com a intolerância de vizinhos, passageiros de poltronas próximas em ônibus e aviões, visitantes de museus e cinemas, às crianças consideradas por elas, levadas. No geral todos comentavam que o mundo está intolerante, que é preciso ter mais paciência, pois são só crianças.

Então, vamos lá. Segundo Bowlby e Winnicott, a criança desenvolve a capacidade de se preocupar com o outro e sentir culpa em torno dos 3 anos de idade (considerando que a idade emocional e cronológica corram em paralelo). Desta forma, nessa idade, ela já tem capacidade de compreender que algo pode ferir ou prejudicar alguém (emocional ou fisicamente) e sentir-se mal por isso. Se uma criança em torno de 3 anos é capaz de sentir culpa, arrepender-se e começar a desenvolver repertórios de reparação, ela precisa ser vista e tratada como tal.
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Considerando que um condomínio possui regras de silêncio após às 22h00, e um filho resolve jogar bolinhas ou brinquedos no chão após esse horário, onde está o problema? No vizinho que reclama ou na mãe e no pai que não orienta que existem regras e que ele precisa entender que há outras pessoas embaixo que precisam ser respeitadas.

Imaginem um voo com crianças que ficam chutando a poltrona da frente, abrindo e fechando a mesinha. Onde está o problema? No passageiro que olha pra trás e reclama (com educação, eu espero) ou na mãe e no pai que apenas puxam as pernas deles e falam: não chuta!?

A criança precisa de explicação, e é capaz de entender desde cedo. Ela precisa saber pq não pode fazer barulho, pq não pode chutar o banco da frente ou ficar abrindo e fechando a mesinha. Ela precisa sentir empatia por aquela pessoa. Não é uma questão simplesmente de proibir. É uma questão de explicar, dar exemplos, colocar afeto. Mas isso requer tempo, dedicação, paciência, firmeza.

Estamos vivendo em uma sociedade na qual a prefeitura bloqueia avenidas repletas de hospitais, onde não se pode sequer buzinar, para festejos de carnaval com trios elétricos cujos decibéis afetam UTIs. Vivendo em uma sociedade que abandona os fones de ouvido e parte para as caixas de som super potentes ou tablets tocando galinha pintadinha para passar o tempo e manter crianças e adultos entretidos a qualquer custo. Uma sociedade em que mesmo os cinemas tendo adotados inúmeras formas de alertar sobre celulares e conversas durante os filmes, tem sempre um que não desliga, ou que fica conversando durante a sessão.

É isso que queremos para os nossos filhos? Um mundo cada vez mais individualista e egocentrado, onde o que importa é a realização dos meus desejos, custe o que custar ao outro (isso se é que enxergo o outro)? O que estamos ensinando quando levamos nossas caixas de som para a praia, quando deixamos que eles ouçam seus vídeos no tablet sem fones de ouvido (ainda que pareça estar baixinho), quando não paramos na faixa de pedestre, quando infringimos regras sociais, quando batemos papo no meio do filme, quando enfrentamos diretores e coordenadores de escolas para atender exclusivamente os nossos anseios?

Costumo dizer que educar é a tarefa mais difícil de qualquer pai e mãe. Pq ela requer valores e regras bem definidos e afinados entre os pais, persistência, paciência, perseverança, firmeza. Educar requer exemplo. E nós, pais, somos o maior exemplo que eles podem seguir.

O intuito do blog é falar de psicologia e viagens, então gostaria que vcs refletissem sobre o exercício da empatia com seus filhos durante uma viagem. Seja ela à praia, pertinho de casa, seja um voo longo e cansativo. Como ensinar nossos filhos e servir de exemplo para eles? As experiências significativas são as que são introjetadas mais facilmente. Uma viagem em família costuma ser carregada de afeto e, dessa forma, repleta de significado. Então, fica a dica pra quando for programar sua próxima viagem, incluir exercícios de empatia para vc e para seu filho no roteiro. Pode apostar que vai ser incrível!

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